quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE (Parte II)

  1. Posse-Trabalho:
A posse-trabalho, ou pro labore, é situação especialíssima, que exige um conjunto de requisitos, à saber:
a) O objeto deve consistir de extensa área;
b) Posse ininterrupta e de boa-fé, durante mais de cinco anos, por considerável número de pessoas;
c) Execução, pelos possuidores, em conjunto ou separadamente, de obras ou serviços de interesse social e economicamente relevantes;
A boa-fé consiste no desconhecimento da existência de algum impedimento ou obstáculo legal à posse do objeto. Não cabe aos compossuidores a sua prova, mas, ao inverso, será uma atribuição do reivindicante a comprovação de eventual má-fé dos ocupantes de extensa área. Caso os compossuidores tenham justo título, a boa-fé será presumível.
A posse-trabalho foi alvo de duras críticas, pois abalaria o direito de propriedade, e instigaria a invasão de glebas urbanas e rurais, fazendo surgir uma nova forma de perda do direito de propriedade. Porém, há quem reconheça neste dispositivo uma saída para a grave injustiça às famílias carentes de espaço físico para moradia e trabalho.



  1. Especificidades da Função Social da Propriedade:
A partir do momento em que o ordenamento jurídico reconheceu que o exercício dos poderes do proprietário não deveria ser protegido tão-somente para satisfação do seu interesse, a função da propriedade tornou-se social. A função social da propriedade passou a ser vista sob três aspectos:
                     a) A privação de determinadas faculdades;
                    b) A criação de um complexo de condição para o que o proprietário possa exercer seus poderes;
            c) A obrigação de exercer certos direitos elementares do domínio. Só os bens produtivos são idôneos à satisfação de interesses econômicos e coletivos que constituem o pressuposto de fato da função social.
Desta forma, a propriedade deixou de ser o direito subjetivo do individuo e tende a se tornar a função social do detentor da riqueza mobiliária e imobiliária. A propriedade implica para todo detentor de uma riqueza a obrigação de empregá-la para o crescimento da riqueza social e para a interdependência social. Só o proprietário pode executar uma certa tarefa social. Só ele pode aumentar a riqueza geral utilizando sua própria propriedade, que não é um direito intangível e sagrado, mas um direito em contínua mudança que se deve modelar sobre as necessidades sociais que precisa atender. A função social da propriedade configura a atividade do produtor de riqueza, do empresário, do capitalista, como exercício de uma profissão no interesse geral. Seu conteúdo essencial permanece o mesmo, assim como seus componentes estruturais. A propriedade continua sendo privada, exclusiva transmissível livremente. Do fato de poder ser desapropriada com maior facilidade e de poder ser nacionalizada com maior desenvoltura não resulta que sua substancia esteja sendo deteriorada.
Atualmente, o direito individual sobre as coisas impõe deveres em proveito da sociedade e até mesmo no interesse de que não é proprietário da coisa. A utilização da coisa varia conforme a vocação social do bem no qual recai o direito, conforme a intensidade do interesse geral que o delimita e conforme sua natureza na principal rerum divisio tradicional.
A propriedade deve ser entendida como função social tanto em relação aos bens imóveis quanto em relação aos bens móveis. A concepção finalista acompanha a propriedade rural, em primeiro lugar, porque a terra era ate pouco tempo atrás o bem de produção por excelência e a empresa, que é o seu objeto na propriedade produtiva da sociedade industrial, bem como, embora sem a mesma eficácia, os valores mobiliários. Se trata de um conceito de função social que polariza a propriedade para a realização de finalidades ou objetivos sociais.
A propriedade obriga, e seu uso deve concorrer também para o bem da coletividade. A previsão constitucional de que a propriedade tem uma função social e não pode ser exercida contra o interesse coletivo só foi ocorrer de forma clara na ultima, promulgada em 1988. Não obstante, a Constituição de 1946 prescreveu que o uso da propriedade deveria ser direcionado ao bem-estar social, bem como no ante-projeto da Constituição de 1934 o conceito já era defendido.
O Estatuto da Terra (lei 4.504/64) seguiu essa orientação ao regular as justas relações de trabalho.
Não define expressamente função social nem estabelece limitações ao direito do proprietário que venham a puni-lo em caso de descumprimento. Apenas traça o comportamento regular do proprietário, exigindo que exerça o seu direito numa dimensão que realize interesses sociais sem a eliminação do domínio privado do bem que lhe assegura as faculdades do uso, gozo e disposição. Esse comportamento não implica o cumprimento de obrigação positiva, nem determina limitações ao direito sob forma negativa, devendo tê-lo também os possuidores não-proprietários.
No tocante à propriedade rural, o art. 186 CF/88 estabeleceu requisitos, segundo critérios e graus de exigência que foram previstos em lei ordinária, para que a propriedade rural cumpra com sua função social, quais sejam:
a)    Aproveitamento racional e adequado;
b)    Utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
c)    Observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
d)    Exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores;


Bruno Tussi
OAB/RS 42E461

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